quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

NO VELHO OESTE (E SEM ARMAS)

NO VELHO OESTE (E SEM ARMAS)

Estamos ainda na segunda quinzena de janeiro e já temos o triste (louco, medonho, surreal) número de 114 mortos na cidade este ano (por enquanto, pois não vi os últimos noticiários). E não estamos em guerra civil (dizem), vivemos tempos de “paz”. Mas comparem nossa estatística de número de mortos com a de qualquer conflito armado mundo afora anunciado fartamente pelos meios de comunicação e verão que tal afirmativa é absurdamente falsa. Estamos em guerra, sim!!!! Guerra braba, descontrolada, cruel e injusta, pois quem tem mais grana para se proteger consegue ir escapando.
Vivo num bairro de classe média, remediada, de senhoras católicas, de artistas, funcionários públicos, estudantes: uma Gentilândia praticamente sitiada! Entregue à marginalidade da pobreza, da droga (que irmandade cruel essa entre o estudante universitário que divide um baseado com o louquinho da Marechal), do conluio entre a incompetência e o descaso de nossos três podres poderes.
Nosso minúsculo reino está condensado na democrática Praça da Gentilândia, onde o craque que outrora despontava no campinho entre mangueiras hoje é outro, cruel e sem possibilidade de gol. Ali, bem do ladinho, senhores e senhoras de preto pregam o fim de tudo, de todas nossas esperanças, e já quase anunciam o final do mundo. Em surdina preparam o golpe fatal: os velhos líderes (que um dia foram sonhadores jovens no Araguaia) organizam seus messiânicos seguidores para um ritual de suicídio coletivo que se realizará em breve na estação Benfica de nosso demoradíssimo metrô.
Enquanto isso, nossos meninos descem da Brasília, do Jardim América, dos mil buracos da Marechal e socializam na marra nossas parcas “riquezas”.
Enquanto isso, motoqueiros assassinos campeiam e matam nossos Eunucos e Eulinos.
Enquanto isso, nossos estudantes gazeiam aulas, fazem sinais de fumaça e perguntam (ou retornam?) ao pó.
E para nos proteger apenas o nosso Chapolim Colorado (de arco, cachaça e flecha), o índio Pelezinho.
E algumas piedosas senhorinhas, que preparam já as novenas de maio, quando Nossa Senhora (entre cânticos) peregrinará, de casa em casa, quase todo o bairro.
No lugar da hóstia o bolo de macaxeira, e do vinho, o copinho de Aluá.

Pedro Salgueiro

CARNAVAL

CARNAVAL
“E eu vou sair fantasiado de alegria por aí... mas na quarta-feira a gente vê que é mentira meu sorriso sem você.”
(Ednardo)
Nunca fui um folião de verdade, daqueles que se paramentam de fantasia, confetes e serpentinas e sai por aí (sozinho ou em turma) curtindo os quatro dias de contagiante alegria.
Sou um brincante frustrado, desses que adora o carnaval, curte o clima de festa dos outros, mas que se sente um peixe fora d’água no meio de um bloco (O máximo que consigo é acompanhá-lo assim meio de lado, como querendo me esquivar. Então me rendo à minha falta de jeito, procuro um cantinho calmo de calçada e fico olhando de longe. O último dos pipocas!).
Culpa talvez da benéfica rigidez de meu pai, para quem festas, namoro cedo e vícios eram coisas mais que proibidas para os onze filhos.
Cresci, pois, um sujeito duro de corpo, que não aprendeu dançar, nadar e só fui beber aos 35 anos.
Mas não foi por falta de tentativas nem de oportunidades. Quando criança, lá pelos anos 70, dava umas escapulidas com os primos para ver de longe os descontraído jovens da minha pequena cidade, era moda se jogar muita maisena e limpar narizes com misteriosos lençinhos. No outro dia bem cedo saíamos pelas ruas, admirados com as paredes brancas, catando serpentinas, confetes e latas para brincar no restante do dia.
Nos anos 80, morando em Recife, não perdia um bloco de bairro, um Pátio de São Pedro, um cordão de Olinda. Sempre de viés, meio envergonhado, ia (em vão) tentando me tornar um descontraído folião.
Já em Fortaleza nos anos 90, terra de quase nenhuma folia, me aquietei de vez. Admiti minha total falta de jeito para a coisa.
Mas adoro quando chega o período dos pré-carnavais (que, ao contrário de um carnaval sem nenhuma história, vai se tornando uma tradição) e vejo alegria e descontração no rosto das pessoas. Escolho alguns blocos e fico urubuservando de longe, latinha de cerveja na mão, ligeiro meneio de cabeça, mesmo com os calcanhares bem presos no chão.
E como para coroar minha falta de jeito com a folia, recentemente o bloco “Luxo da Aldeia” (que só toca compositores cearenses) se instalou na rua em que eu moro, umas três casas da minha, com palco virado para a Rua João Gentil e devidamente de costas para a nossa calçada.

PEDRO SALGUEIRO